segunda-feira, 28 de julho de 2008

NADA SERÁ COMO ANTES

Durante minha vida de casado, todo natal e todo ano novo viajávamos para Caraguá. Era como se fosse nossa Meca, só que ao invés de irmos apenas uma vez na vida, íamos toda vez. Nunca fui muito de festejar o Natal, gostava mesmo do Ano Novo. Talvez por ser uma festa pagã ou que se baseie no desejo, na felicidade e na esperança de paz, dinheiro, saúde e outras coisas menos prováveis de acontecer. Mas como disse o natal sempre foi das festas do final do ano a que menos me entusiasmava. Porém devo admitir que esta festa carregava e carrega uma carga de família, de amor, de reclusão e de introversão tão importante ao ser humano.Tudo o que aconteceu durante o ano é repassado em nossas cabeças, pesado, avaliado e nos tornamos mais abertos a pequenas coisas que em outra época do ano poderíamos achar fúteis ou no mínimo corriqueiras. O livro ”O Natal dos Anjos” encontra uma explicação para isto no místico: “Nessa época do ano toda a Terra vibra com as maravilhosas forças derramadas pelos anjos e com a poderosa bênção do Cristo, que desce em resposta à sua adoração”. Poderia ser uma explicação para estarmos mais calmos, pensativos e mais aptos a atos e pensamentos melhores, menos gananciosos e cheios de bondade e caridade. O livro reforça a idéia nesta passagem: “No período do advento, na verdade muitas semanas antes, é feita de várias maneiras a preparação, nos mundos interiores, para a celebração do grande festival; as influências tornam –se mais fortes e mais intensas à medida que os dias passam, até que, atingindo a culminância no Dia de Natal, o mundo abre seu coração para o Senhor como uma flor abre suas pétalas para o Sol, e uma torrente de amor e força é derramada pelo próprio Cristo, como encarnação na Terra da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade.” Portanto o Natal carrega um lado místico e mítico, um ritual de passagem importante para os cristãos no mundo todo. Um ritual que carrega toda um ritualismo baseado em confraternização, amizade e companheirismo e na vida, porque trata de um nascimento em particular e isto adocica, suaviza e humaniza as pessoas em geral. E vendo sob este prisma eu gosto muito do Natal.Nos Natais de minha infância e adolescência, a parte mais importante da comemoração era o almoço no dia de Natal. Era uma atividade Ágape com todos meus tios, tias, avô e avó freqüentando a casa de minha mãe e trazendo cada família um prato especial. Uma família trazia o Peru, outra fazia o porco, outra o frango, o arroz, a salada de maionese, a sobremesa. A idéia mais marcante destes natais era o macarrão de forno da minha avó e o clima de confraternização e companheirismo da família não percebida durante o ano todo.Enquanto que nos Natais de minha vida de casado, sempre se seguiu o ritual da família de minha esposa. A ceia na véspera do Natal, com comidas feitas pela minha sogra, minha cunhada e minha esposa. Elas preparavam o frango, o peru, o tender que meu filho e meu sogro gostavam, o porco e faziam também as saladas de folhas, de couve-flor, de brócolos, de grão de bico , bem com as várias sobremesas, isto sem falar na preparação das mesas onde eram colocadas todas estas delícias em cima das toalhas pintadas com motivos natalinos, fruteiras com frutas de época e natalinas tais como figo, ameixa vermelha, nectarina, lichia, uvas passas, damasco, figo seco e outras .Nestes Natais o que era mais marcante era a cooperação, o ritmo alucinante para se fazer tudo, quase uma fábrica de fazer comida e principalmente a quantidade de comida que dava para a Ceia e para os dias seguintes. O mais interessante eram os dias seguintes, afinal nos colocávamos numa posição semelhante aos antigos povos, quando da celebração da colheita anual que ficavam até um mês sem trabalhar, apenas comendo o que fora estocado depois da ceia.Houve fatos marcantes durante os natais, tanto de minha infância como de minha vida de casado. Houve as rusgas naturais que encontros como este causam, já que é muita gente a se encontrar. Algumas mágoas que se afloram, com algumas insinuações impróprias. Alguns momentos tristes como quando meu tio e anos depois meu avó adoeceram e a família de meu pai sentiu um baque na comemoração do natal ou também quando minha sogra estava prestes a falecer, só não sabíamos quanto mais duraria, poderia falecer inclusive no Natal ou no Ano Novo, veio a falecer no dia 4 de Janeiro, mas nos vimos obrigados a realizar as cerimônias , principalmente a natalina, porque era do gosto de minha sogra (ela sempre fez questão da comemoração desta data pela família e gostava de todo o ritual) e do meu sogro. O que é mais marcante nesta data é capacidade do homem perdoar e redescobrir a felicidade em pequenos gestos, afastando assim os maus sentimentos, rancores e mágoas, talvez porque com diz o livro “Natal dos Anjos”...”Geralmente vemos o universo do ponto de vista da forma: pensamos primeiro na forma e só depois na vida que a energiza e lhe dá a alma, o que é tipicamente humano” e logo depois esclarece “...O anjo, porém, encararia o homem sob o ponto de vista da consciência, olhá-lo-ia para verificar o quanto de Vida Divina está nele manifestada; o quanto de força seria possível acionar por seu intermédio; e somente depois atentaria para forma de seus corpos superiores...” portanto se nesta data os anjos estão agindo sobre os seres humanos, e ficamos mais aptos de observar a anima , ou seja, a alma das pessoas.Talvez por isso tanto nos natais idos de minha infância- adolescência, bem com na fase adulta, por mais que brigássemos, emburrássemos (e como emburrávamos, quando se falava ou fazia alguma coisa que não gostássemos) ou ficássemos aborrecidos, as coisas se tornavam mais amenas, mais felizes, mais ingênuas, mais humanas, Oh não, digo angelicais. Nem mesmo quando minha sogra estava prestes a morrer no ano retrasado, nem com minha sogra e meu pai mortos no ano passado o natal foi pesado ou depressivo. Nos natais idos da infância o que segurava a cerimônia era a própria situação de confraternização da família, enquanto que na fase adulta era meu sogro que era a parte irônica, sarcástica da festa, dando uma pitada a mais de alegria e relaxamento para a data.Durante todo ano, meu sogro se preparava para estes dias (Natal e Ano Novo), combinando sobre os tipos de comida, doces, saladas e bebidas que iria ter, depois organizava e/ou comprava tudo mesmo quando em cadeira de rodas sem poder se locomover direito . Durante as festas era o mais alegre, o mais simpático, o mais brincalhão, aquele que não podia ver ninguém triste para fazer uma ironia, a fim de que pusesse a pessoa a sorrir, a rir, a gargalhar, talvez o espírito natalino se concentrasse mais nele, talvez os anjos concentrassem suas forças etéreas em cima dele.Porém neste natal já não haverá seu lugar a mesa, não escutaremos mais suas piadas (muitas repetidas todos os anos e nem por isso menos engraçadas), não veremos mais silhueta, não sentiremos mais seu perfume, nem a quentura de sua pele, muito menos sua alegria durante as ceias de natal e de ano novo e portanto nada será como antes, e data poderá não conseguir nos tocar na sensibilidade, na emoção, n’alma como já vimos em outros momentos, a não ser que meu sogro tenha se tornado um anjo a mais a influenciar o nosso Natal e Ano Novo, deixando os mesmos mais alegres tal qual sempre foi seu jeito de ser.Novembro de 2001

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